Na terça-feira, 13/7, a Comissão de Regulamentação da Objeção de Consciência na UFRRJ realizou uma audiência pública sobre a minuta da deliberação à objeção de consciência ao uso de animais nas aulas práticas da Universidade. Criada pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe) em 2019, a Comissão, que é presidida pelo pró-reitor adjunto de graduação Edson Jesus, busca tornar os processos educativos que se utilizem de animais vivos ou mortos em uma decisão optativa, garantindo aos discentes a livre escolha a não fazer algo que lhe fira a consciência.
A discussão sobre o tema acontece desde 2013, principalmente no Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde (ICBS) e no Instituto de Veterinária (IV), onde a prática do uso de animais nas salas de aula ainda é constante. O debate segue em pauta nos institutos, onde há polarização de opiniões sobre o assunto.
Durante a audiência, o palestrante convidado, professor Thales Tréz, da Universidade Federal de Alfenas, relatou sua experiência com estudantes objetores ao longo dos anos. “Eu pude acompanhar de forma muito próxima, casos de estudantes que se viam completamente desencontrados, desconfortáveis e críticos a essas aulas práticas com animais. Em diversos cursos, veterinária, psicologia, biologia e na própria medicina humana eu tive a oportunidade de conhecer estudantes que abandonavam os cursos, que estavam bastante motivados mas que não deram conta da pressão que acontecia com bastante frequência ao se posicionarem contra essas práticas com animais.”, comentou o o professor.
Em um artigo publicado em 2015, Tréz, que é membro do Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal, categoriza o uso de animais em três tipos: uso benéfico de animais, uso neutro e uso prejudicial. No uso benéfico, os animais são utilizados em sala de aula visando um benefício ao próprio animal, como em casos de castração ou outros procedimentos clínicos que envolvem a saúde do animal. O uso neutro trata-se de um método de observação, onde os estudantes anotam os comportamentos dos animais. Já a terceira categoria, centro de toda a problematização, é o uso prejudicial de animais. Nesta, o animal deixa de ser um sujeito e é tratado apenas como objeto, tendo seus interesses desconsiderados.
O segundo convidado da mesa, Laerte Levai, especialista em bioética, destaca que “nenhum aluno deve ser forçado a realizar experimentação animal, sobretudo quando tal prática ofende as suas convicções e aderir ou não a metodologia didático-científica tradicional é uma opção que deveria ser interpretada não como uma liberalidade docente, mas como um direito legítimo do estudante.”
Como meio legítimo de preservar convicções morais, políticas e culturais de forma geral, o estudante que se opuser a dissecção de animais pode invocar em seu favor a chamada cláusula da objeção de consciência prescrita na Constituição Federal. O aluno tem o direito de apresentar um trabalho substitutivo, realizado sem o uso de animais e sem que ocorra qualquer prejuízo em suas avaliações pelos professores.
Na UFRRJ, até o momento, apenas o Instituto de Veterinária (IV) possui aprovação do Regulamento da Objeção de Consciência. A minuta publicada pela Comissão busca expandir a regulamentação para os demais cursos que pratiquem atividades com animais na Rural.
Para o aluno do curso de Medicina Veterinária da Rural, Joshua Dylan, membro da Comissão na UFRRJ, o processo de extensão da regulamentação para toda a Universidade é essencial. “Para os estudantes é de extrema importância que a objeção ganhe visibilidade, pois se trata de um avanço na proteção aos direitos individuais, no que tange à liberdade de crença, e um refinamento da democracia na proteção às minorias dentro da instituição.”, conta.
O professor Luciano Alonso (ICBS/UFRRJ), mediador da audiência, destacou alguns tópicos importantes presentes no documento, como os procedimentos que os estudantes devem seguir caso não queiram utilizar os animais nas práticas de seu curso, as instâncias que tratarão do tema e os métodos substitutivos ao uso de animais em diferentes disciplinas. “O que se propõe é um ambiente de harmonia, de tranquilidade e construção do conhecimento, de avanço dos métodos científicos, incluindo a possibilidade de substituição do uso de animais.”, relata o professor.
Após a apresentação da minuta, a Comissão de Regulamentação da Objeção de Consciência na UFRRJ encaminhou o documento para avaliação do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe).
Leia a minuta do documento encaminhado ao Cepe: clique aqui
Assista ao vídeo da audiência pública: clique aqui
Texto: Isabele Bard – estagiária de Jornalismo da Prograd/CCS
Imagem: freepik