Estas linhas são motivadas pela minha recente participação na III Conferência Regional de Educação Superior (CRES 2018), realizada na Argentina, junto com o reitor Ricardo Berbara e a pró-reitora adjunta de Extensão, Gabriela Rizo.
Ao refletirmos sobre o tripé ensino-pesquisa-extensão e suas recentes dimensões, como a internacionalização e a inovação tecnológica, concluímos que são a base da universidade moderna.
Entretanto, nem sempre foi assim. Até meados do século XX, predominou um modelo bastante diferente na América Latina: a universidade excludente, com cargos vitalícios e cátedras hereditárias, acessível apenas às famílias vinculadas às oligarquias detentoras do poder político. Uma universidade sem vínculos institucionais com a sociedade, notoriamente elitista, autocrática e sem conexão com a realidade continental.
Foi nesse contexto, e contra esse modelo arcaico que, em 1918, estudantes da Universidad Nacional de Córdoba ocuparam suas instalações e assumiram o governo da instituição. Essa insurgência, bem como a mensagem e o alto grau de heroísmo, teve grandes reflexos no desenvolvimento das universidades, dando início a mudanças substanciais na sua estrutura. Esse processo, conhecido como a “Reforma Universitaria” e seu famoso “Manifiesto Liminar”, propôs uma universidade democrática e com projeção latino-americana. Dessa forma, a autonomia universitária, a gratuidade do ensino superior, a liberdade acadêmica, a participação de todos os setores da comunidade universitária na gestão, a realização de concursos públicos para cátedras, o estabelecimento da extensão universitária e a solidariedade internacional foram as principais bandeiras levantadas pela Reforma.
Decorridos 100 anos, novas dimensões e problemáticas passam a fazer parte dos desafios enfrentados pelas universidades da América Latina. A CRES 2018 foi realizada na Universidad Nacional de Córdoba não apenas para comemorar o centenário desta epopeia heroica protagonizada por estudantes argentinos, mas também para servir como foro para que mais de 14 mil participantes pudessem discutir os rumos e os desafios das universidades latino-americanas. A declaração referendada nesse evento reafirmou a defesa da universidade pública, a importância da internacionalização com foco regional, o aprofundamento das ações inclusivas e de extensão social, a luta contra a mercantilização do ensino superior e a discussão do aprofundamento dos vínculos entre as universidades da América Latina por meio da intensificação da mobilidade internacional. Como principal destaque, houve a defesa da autonomia universitária, considerada condição essencial para que as instituições desempenhem um papel crítico e proativo em relação à sociedade.
Nesse sentido e fiel às suas melhores tradições, a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro esteve presente na conferência, e constatamos que na atual conjuntura, adversa às universidades públicas brasileiras, o legado da Reforma Universitária adquire maior transcendência e
mostra uma vigência inabalável.
Artigo de José Luís Luque publicado na edição 08/2018 do Rural Semanal.
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