A “praia” do cientista Leandro Alvim é estudar inteligência artificial. É no Departamento de Ciência da Computação do Instituto Multidisciplinar (IM), em Nova Iguaçu, que o pesquisador gerencia um projeto, desde 2013, sobre um tema que tem a cara das novas tendências das tecnologias de marketing na internet: o behavioral targeting. Em parceria com a FAPUR e com o site de comparação de preços Buscapé, Alvim desenvolve formas de entender o perfil dos usuários e, com base nessas informações, direciona propagandas personalizadas.
Behavioral targeting é um conceito do marketing chamado de “segmentação comportamental”, porque trata de uma estratégia para perceber os hábitos de navegação e de consumo do internauta. Para que isso seja possível, Alvim criou uma espécie de robô que interpreta essas informações deixadas pelos usuários no site. Esses dados indicam as preferências do internauta a partir das ofertas que ele clica ou dos produtos que procura. Com esse material, é possível gerar estatísticas. O celular, por exemplo, é o item mais procurado no portal, de acordo com informações do robô. Produtos eletrônicos em geral são os favoritos dos usuários que visitam o Buscapé.
Para Alvim, essa tecnologia é importante para ajudar o usuário a otimizar sua navegação na internet.
“A empresa Buscapé tem as informações dos usuários que navegam no site. Por meio dessas informações, o objetivo do projeto é melhorar a navegação deles, minimizando o tempo em que eles procuram uma oferta e apresentando produtos que melhor se adequam ao que eles buscam”, explica o cientista.
Além de recomendar ofertas personalizadas ao usuário, o robô de Alvim também tem a função de organizar os produtos do site nas categorias certas. O pesquisador ressalta que, antigamente, era necessário realizar esse serviço pessoalmente. Hoje, robôs como esse livram empresas de ter que fazer esse trabalho de manutenção.
“Eu desenvolvi algo como se fosse o cérebro do robô. Ele aprende com os dados e vai melhorando. Os benefícios são para os dois lados. Para a empresa, que não precisa ficar constantemente fazendo manutenção, porque o robô é autônomo, e para os usuários, que encontram a informação de forma mais rápida”, explica o professor.
De acordo com o pesquisador, hoje vivemos o que ele chama de “verão” da inteligência artificial. Isso porque esse tipo de tecnologia já é tendência no mercado e caracteriza grande parte do trabalho realizado pela rede social Facebook e pelo site de buscas Google.
“A inteligência artificial começou no pós-guerra. Naquela época, se falava muito sobre o assunto, redes neurais foram se desenvolvendo. Depois, houve uma fase em que a gente chama de ‘inverno’ da inteligência artificial, entre as décadas de 80 e 90. Nesse tempo, não se tinha os dados que a gente tem hoje para a máquina aprender, e as máquinas não tinham o poder de processamento que têm hoje. A pesquisa se estagnou e a aplicação nas empresas parou”, conta ele. “Hoje em dia, o Facebook consegue identificar você em qualquer foto, porque eles têm um algoritmo que, por meio de todas as imagens, classificam quem é você, quem é a outra pessoa. Antigamente, não dava para fazer isso”, complementa.
Segundo ele, o desenvolvimento dessas tecnologias é possível a partir de uma parceria entre empresas e a academia.
“Atualmente, as empresas estão aplicando inteligência artificial e se juntando com a academia. O Facebook e o Google, por exemplo, têm laboratórios de pesquisa, acordos com universidades e há professores que também colaboram. Então, hoje, há um boom de novo, que a gente chama de ‘verão’. Muitas empresas estão aplicando essa tecnologia para resolverem os problemas do dia a dia”, explica Alvim.
Para o professor, o futuro da inteligência artificial deve ultrapassar os computadores e chegar nos objetos comuns, como automóveis, eletrodomésticos e até vestimentas.
“A internet das coisas será um mercado que vai movimentar bilhões mundialmente. Na indústria automobilística, por exemplo, a tendência é que os carros tenham mais sensores de ambiente e virem carros inteligentes. As ferramentas e os objetos que a gente usa vão cada vez mais guardar informações: geladeiras inteligentes, casas digitais, relógios e roupas. É como se o ser humano digitalizasse o ambiente em que vive”, opina.
Segundo ele, um dos impactos da inteligência artificial é na oferta de empregos. Como essa tecnologia serve para administrar tarefas repetitivas, as pessoas que eram pagas para executar essas funções podem perder seus postos. Porém, Alvim ressalta que esse tipo de processo é normal e novas demandas surgem com o tempo.
“Os empregos se transformam. Existem inúmeros casos na história da sociedade que podemos mencionar, como, por exemplo: a invenção da prensa, por Gutemberg, em que os escribas se sentiram ameaçados; a descoberta da eletricidade, com o fim dos acendedores de lampião; o tear, empregado para fins de tecelagem; e o próprio automóvel, que culminou o fim dos carroceiros. Mas todas essas transformações ocorreram para o melhor do todo e os empregos foram transformados”, argumenta. “No caso da prensa, vieram os jornais empregando nova mão de obra; a eletricidade também demandou mão de obra para instalação de fios, desenvolvimento de transformações e usinas. Com relação ao automóvel, saiu o carroceiro e entra o ônibus, o táxi e as vans. O mesmo processo está acontecendo agora, na questão da inteligência artificial. Fica claro que vai tirar emprego das pessoas, mas novos surgirão. Um grande exemplo é a nova carreira de cientista de dados. Quando você resolve um problema, são criados novos problemas”, observa ele.
O professor destaca também que a escolaridade será um fator decisivo nessas transformações sociais.
“O que o Brasil deve ter como preocupação é a educação. Os empregos vão ficando cada vez mais especializados, o que demanda por uma melhor escolaridade. Esse que é o problema ao meu ver: se não tivermos uma educação pública e universal de qualidade, quem vai trabalhar no nosso lugar vai ser o estrangeiro, e não o brasileiro”, ressalta.
A FAPUR colabora no projeto oferecendo assistência burocrática. Aliás, não é a única pesquisa do professor que a Fundação apoia: Alvim já teve estudos com temas como o envolvimento de internautas nas redes sociais e o desenvolvimento de estimativas de crédito para empresas. Para o cientista, apoiar pesquisas como essas é importante porque existe retorno para a universidade e para a sociedade.
“Como a minha área é de computação aplicada, a importância desse projeto é conseguir aplicar o que a gente estuda. E você tem uma espécie de retorno para a sociedade, porque você melhora esse serviço”, diz o professor. “E para a universidade, é positivo porque projetos como esse abrem a possibilidade de se conseguir bolsas, publicar e apresentar trabalhos em congressos e estabelecer um link direto entre alunos e empresas”, complementa.
Um exemplo que comprova o retorno de projetos como esse, segundo o professor, é o caso do estudante Rodolpho Rosa, que baseou seu trabalho de conclusão de curso em um problema relacionado ao projeto e utilizou dados cedidos pela empresa Buscapé. No fim, o jovem conseguiu publicar no Congresso Brasileiro de Inteligência Computacional, uma conferência internacional organizada pela Sociedade Brasileira de Inteligência Computacional. Outro exemplo foi o discente Douglas Castro, que recebeu uma bolsa para desenvolvimento de pesquisa com a empresa de software Intelie. “Também temos, agora, alunos estagiários e efetivados nesta mesma empresa”, finaliza Alvim.
Por Victor Ohana, da FAPUR.