Texto: Thaís Melo*
“A carne mais barata do mercado é a carne negra” é um trecho da música “A Carne” de Elza Soares que abre a peça “Café frio também ferve”. A obra aborda questões como racismo, desigualdade social, violência e invisibilização da população periférica. O espetáculo estreou na UFRRJ em 5 de dezembro. Foram três apresentações realizadas pelo Núcleo de Dramaturgia e Genética da Cena Contemporânea no auditório Gustavo Dutra (Gustavão).
A plateia acompanha a história de três empregadas domésticas pretas, pobres, e de regiões periféricas da cidade que viajam no trem a caminho do trabalho. No elenco, estavam os atores Anna Moreira, Perla Carvalho, Suelem Santos e Luiz Bastos. O texto e direção é de Thiago Cinquine. Já a iluminação foi feita por Lucas Maciel e a sonoplastia ficou por conta de Paulo Téspis.
A peça tem o diferencial de ser feita no formato radiofônico. Os atores usam sobretudo suas vozes. Os sons típicos de uma rádio estão presentes a todo momento. A obra tem até os intervalos habituais das programações das emissoras e os usa para intercalar relatos dos atores à história da peça. Todos os relatos falam de situações em que os artistas sofreram discriminação por serem negros ou de periferias.
A atriz e jornalista Perla Carvalho contou como foi a escolha dos temas abordados nos relatos. “Nós resolvemos falar muito do cotidiano do povo periférico, a gente vive essa realidade de ir daqui para outros bairros para trabalhar e tem a questão da violência doméstica, da desigualdade social, do racismo e nós queríamos colocar isso tudo na peça”, explicou a atriz.
O autor do texto Thiago Ciquine explicou porque o espetáculo se passa no trem. “Primeiro que eu sou um usuário de trem, ir para a universidade para mim é sempre uma realidade de dificuldade. É muito louco você pensar que uma pessoa leva três horas e meia para ir e voltar do trabalho ou da aula. Você não vive a vida, você não descansa. Tanto que eu digo isso no texto. O tempo que deveria ser do nosso descanso a gente passa dentro de um transporte público”, contou o estudante de artes cênicas.
A obra aborda questões delicadas e frequentes no cotidiano de muitos brasileiros. O ator Luiz Bastos falou sobre a importância de abordar tais assuntos. “É uma peça importante porque é da gente para a gente. É colocar talvez uma lupa e uma atenção maior em cima de uma história que acontece e que é negligenciada no dia a dia”, relatou.
A peça teve sua estreia na UFRRJ, mas o texto já foi premiado no ano passado. O autor ganhou o Prêmio Sesc de Dramaturgia 2018 e teve seu trabalho publicado pela editora Sesc. Mexendo em feridas sociais, enquanto retratam o cotidiano, os atores tocaram os presentes com uma história forte, delicada e necessária de ser contada. Ao final do espetáculo, o autor se juntou ao elenco para que juntos respondessem às perguntas da plateia.
Comunicação Proext*