“O triste é que o pobre tem que comer com veneno e o rico que põe veneno pode pagar para comer aquilo que não tem veneno”
A roda de conversa com o engenheiro florestal e cientista ambiental Sebastião Pinheiro discutiu assuntos variados – desde a Soberania Alimentar no campo até o Biopoder camponês. Um dos objetivos da reunião foi aproximar a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) de pautas ligadas ao campo. O debate aconteceu na última sexta-feira (26/07) no Quiosque da Casa do Reitor, da UFRRJ, em Seropédica.
O encontro foi organizado pelo Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e a Federação de Estudantes de Agronomia do Brasil (Feab), com o apoio do Centro de Memórias do Museu da Casa do Reitor e do Grupo de Agricultura Ecológica (GAE) da UFRRJ. “É muito importante a presença do Sebastião Pinheiro aqui porque fortalece quem está buscando o tipo de agricultura da vida, não uma agricultura da morte. Não é a agricultura que apoiou a Revolução Verde e seus subprodutos da indústria da guerra, nem o agronegócio que transforma comida em mercadoria, e sim, a que utiliza produtos naturais cultivados por camponeses que promovem a Soberania Alimentar“, reitera o professor do CTUR e dirigente estadual do MPA, Robledo Mendes.
Entre fotos e declarações emocionantes, Sebastião Pinheiro, acompanhado de Kassio Carvalho do MPA-PE, foi recebido no Quiosque da Casa do Reitor por muitos admiradores de sua trajetória científica e luta política no campo. Antes mesmo do início do debate, o cientista deu autógrafos em livros, conversou com alguns participantes e compartilhou conhecimento acadêmico com estudantes universitários. Com a roda de conversa já formada, Sebastião Pinheiro discutiu assuntos relacionados à Agroecologia e ressaltou a importância da resistência contra as imposições dos mais poderosos contra os mais pobres, principalmente no campo. O convidado também respondeu perguntas da roda, composta por membros de todo o país do MPA, GAE e da Feab, além de representantes da Fiocruz, agricultores de diferentes regiões, professores e estudantes de diversos cursos da UFRRJ e do CTUR.
“Pela ancestralidade das outras gerações que passaram pela Rural, pela memória e pelo futuro é que a gente está aqui hoje conversando com camponeses. Estou muito contente que eu abracei diversos camponeses que não me conheciam aqui. Chegar aqui para conversar com eles pessoalmente é muito gratificante. Esse diálogo é o que faz aproximar e construir a coisa mais importante na vida. Lá fora querem o individualismo, mas nós somos grupos, um conjunto. E como conjunto, nós temos segurança de não ser um, ser muito mais que um. Não sermos uma pessoa que logo vai embora, desaparecer como matéria, mas saber que outros vão ficar e continuar levando isso adiante”, disse o cientista ambiental Sebastião Pinheiro.
Ao final da palestra, a artista Andressa Santos (@dessasantoz), aluna de Belas Artes da UFRRJ e bolsista do Museu da Casa do Reitor, em parceria com os movimentos sociais envolvidos no evento, entregou uma pintura feita com tintas naturais do solo, doadas pela professora Clarice de Oliveira, do Museu de Solos da UFRRJ, para Sebastião Pinheiro. Já na hora do almoço, os presentes foram convidados a participarem de uma feijoada vegetariana com frutos da terra no restaurante natural da UFRRJ, a associação Erva Doce. O almoço, acompanhado de música ao vivo, arrecadou recursos que vão ser direcionados para as atividades do coletivo de juventude do MPA e também da Feab.
O Biopoder Camponês
Para os estudantes o debate e a presença da reflexão de Sebastião Pinheiro dentro da UFRRJ é de suma importância para o entendimento de para quem a ciência é e deve ser gerada. Yasmin Antunes, aluna de Agronomia da Universidade Federal de Viçosa (UFV) e membro da Feab diz: “Para nós, o mais importante é essa perspectiva de para quem serve o nosso conhecimento. A gente tá aqui dentro da Universidade estudando, fazendo conhecimento, gerando ciência para grandes empresas e é justamente essa reflexão que ele traz para a gente. Para qual agricultura que nós estamos estudando e quem que a gente está querendo fortalecer. Esse espaço que ele traz de debate dentro da Universidade é muito importante para a gente entender para quem nós temos que gerar ciência”.
Julie Mozer e André Oliveira, estudantes de Agronomia da UFRRJ, afirmam que é muito importante a presença de Sebastião Pinheiro na Universidade, por trazer referências antigas da agricultura: “É muito importante trazer o Sebastião para cá para trazer diversidade e conhecimentos antigos. A gente vai perdendo muitos costumes e é sempre bom revisitar e ele traz isso muito forte, botando opiniões precisas em relação à agroecologia atual, que nada mais é do que a agricultura antiga”.
Entre os conceitos mencionados por Sebastião Pinheiro, está o Biopoder Camponês que se caracteriza pelo movimento que ele comumente faz de visitar locais como universidades e comunidades minoritárias. Nessas visitas, o cientista ambiental normalmente reúne estudantes, associações, movimentos sociais e camponeses para discutir e refletir sobre temas voltados ao campo. Essa união de diversas pessoas em torno de um debate, que leva conhecimento sobre a terra e sobre os alimentos para diferentes locais no país pode ser chamado de o Biopoder Camponês.
“Nós temos que começar a elucidar. O que é fazer consciência quando se enfrenta a propaganda? A propaganda é feita por psiquiatras, por psicólogos, por artistas, por dinheiro e a consciência é feita por e-du-ca-do-res. Hoje quando falamos em um alimento com veneno e um alimento sem veneno você sabe qual escolher. Mas eles criam mecanismos e o mecanismo é diabólico: se você quer vender com veneno, tá livre para vender. Se quiser vender sem veneno, tem que identificar carimbar, selar e gastar 50 mil dólares”, acrescentou.
“Essa é a realidade e a gente não se dá conta disso, por quê? Porque tudo é feito de forma que você tem que denunciar e denunciar. Então você se desgasta denunciando. A gente tem que ter a habilidade de denunciar, rir, trazer alegria e caricaturar o poder. O triste é que o pobre tem que comer com veneno e o rico que põe veneno pode pagar para comer aquilo que não tem veneno. Fascismo isso. Estamos na luta”, finalizou Sebastião Pinheiro.
Serviços
Abaixo segue o perfil do Instagram de algumas organizações envolvidas no evento:
Federação de Estudantes de Agronomia do Brasil: @feabufrrj
Movimento dos(as) Pequenos(as) Agricultores(as): @mpa.brasil
Grupo de Agricultura Ecológica da UFRRJ: @gae.ufrrj
Restaurante com comidas naturais da UFRRJ: @ervadoceufrrj
Museu da Casa do Reitor: @cm.ufrrj
Texto: Matheus Mendonça, bolsista de Jornalismo da CCS
Fotos: Nicole Lopes, bolsista de Jornalismo da CCS
Edição e publicação: Fernanda Barbosa, jornalista e coordenadora da CCS