A construção de ambientes de trabalho saudáveis no âmbito das universidades constitui-se em condição necessária para que os membros de suas comunidades (docentes, técnicos administrativos, estudantes e trabalhadores terceirizados) sintam satisfação na realização de suas atividades laborais de ensino, pesquisa, extensão e administração, contribuindo para elevar os níveis de confiança mútua, criatividade, inovação e dedicação às instituições.
Para tanto, faz-se necessário um esforço convergente de todos os atores institucionais, no incremento progressivo de melhorias nas condições de infraestrutura dos ambientes de trabalho e, principalmente, na promoção de melhorias na qualidade das relações humanas, de tal modo que as universidades não sejam reconhecidas apenas por seus prédios e salas de aula, mas, sobretudo, como lugares frequentados por gente que estuda, trabalha, se alegra, se conhece e se estima, como nos ensinou o mestre Paulo Freire. Em suas palavras, a universidade precisa ser um lugar em que o importante não é só estudar, não é só trabalhar, mas é, também, um lugar para se criar laços de amizade e de camaradagem.
Na construção de um ambiente de trabalho com estas características positivas, é fundamental que todas as formas de assédio (moral e sexual) no âmbito das universidades sejam coibidas, combatidas, apuradas e punidas, uma vez que representam uma violação à dignidade humana.
Apesar destes fenômenos não serem novos ao longo da história, constata-se que, no período recente, o tema do combate ao assédio moral e sexual vem sendo amplamente debatido na sociedade e no interior das universidades, cujas repercussões têm resultado na implementação de medidas preventivas, por meio da promoção de seminários e campanhas educativas, na proposição de códigos de ética e de conduta, na promoção de cursos de capacitação dos (as) gestores (as) para uma postura mais comunicativa, na criação de cartilhas informativas aos públicos internos, na criação de espaços de escuta para dirimir situações de conflito no âmbito do trabalho, entre outras.
Paralelamente às medidas preventivas, o combate ao assédio moral e sexual também precisa ser feito mediante o acionamento dos dispositivos presentes na legislação vigente. Em que pese o fato de não dispormos, ainda, de uma lei federal específica para tratar no assédio moral no âmbito do serviço público, as suas ocorrências podem ser enquadradas nos termos previstos no inciso XI, do Art. 116 (que estabelece como dever, tratar com urbanidade as pessoas) e no inciso V, do Art. 117 (que proíbe a promoção de manifestação de apreço ou desapreço no âmbito da repartição) da Lei n° 8.112/90.
Ademais, a Constituição Federal, em seu artigo 1º, fixa os fundamentos da República, entre eles: cidadania, dignidade da pessoa humana e valores sociais da livre iniciativa (CF/1988, art. 1º, incisos II, III e IV) e, também, em seu artigo 5º, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; (…) III – ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante”. No que diz respeito às ocorrências de assédio sexual, em virtude de o país já dispor de uma lei federal específica, o seu enquadramento já pode ser delimitado com maior objetividade, com previsão de punição aplicável aos infratores.
Sendo assim, pela via legal, o combate ao assédio moral e sexual se faz mediante o encaminhamento das denúncias aos canais institucionais competentes (externos e internos), contendo a descrição da materialidade e autoria para a apuração e aplicação das penalidades e sanções nos termos previstos na legislação e nos regulamentos internos.
Nesta direção, a comunidade da UFRRJ vem construindo – por meio do debate coletivo travado pelos (as) dirigentes institucionais, pelos (as) representantes das categorias dos (as) docentes, discentes e técnicos administrativos no âmbito do Conselho Universitário (Consu) e pelas entidades estudantis (Diretório Central dos Eestudantes) e sindicais (Associação dos Docentes da Universidade Rural e Sindicato dos Trabalhadores em Educação da UFRRJ) – importantes instrumentos para auxiliar no combate às diferentes formas de violência e assédio, entre as quais merecem destaque, o Código de Conduta Discente (Deliberação n° 45, de 31/08/2018) e a Política de Acolhimento às pessoas em situação de violência e promoção da equidade na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (Deliberação nº 430, de 08 de novembro de 2021.
O código de Conduta Discente classifica como infração gravíssima, passível de suspensão de 60 a 90 dias ou desligamento da Universidade, ao discente que: (…) V – expor a perigo a vida e a saúde de outrem; VI – praticar violência que resulte lesão corporal grave, gravíssima ou morte; VII – praticar estupro ou quaisquer outros crimes contra a liberdade sexual; VIII – constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa; IX – praticar, induzir ou incitar, por qualquer meio, a discriminação ou preconceito de gênero, étnico-racial, religião, origem, idade, situação social, econômica e cultural, orientação sexual e identidade de gênero (Lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transgêneros – LGBTT); X – submeter por meio de coação, qualquer membro do corpo discente, especialmente os calouros, a participar de trote universitário; XI – praticar bullying (Art. n° 15).
Nos incisos II e III da Política de Acolhimento às pessoas em situação de violência e promoção da equidade, consideram-se como: (…) Assédio Sexual – Conforme o Art. 213, da Lei n° 12.015/2009, é o constrangimento de alguém, com a intenção de obter vantagem de natureza sexual, utilizando-se para isso, de superioridade hierárquica; Assédio Moral – é a exposição de trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções sendo mais comuns e relações hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração, de um ou mais chefes, dirigida a um ou mais subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização. Caracteriza-se pela atitude desumana, violenta e sem ética nas relações de trabalho, visando desqualificar e desestabilizar emocionalmente a relação da vítima com a organização e o ambiente de trabalho, o que põe em risco a saúde e própria vida da vítima (…).
Em que pese o avanço institucional representado pela criação dos instrumentos acima mencionados, a Administração Central da UFRRJ ao mesmo tempo em que considera intolerável e repudiável a prática do assédio moral e sexual no âmbito da universidade, reconhece que a sua superação, demandará um esforço de diálogo continuado com as três categorias da comunidade universitária e suas entidades representativas, com vistas à consolidação e aperfeiçoamento dos instrumentos normativos em vigor, bem como à proposição de novas ações e políticas voltadas ao enfrentamento deste problema.
Para realizar essa articulação, a UFRRJ instituiu, pela portaria 6517 de 03 de dezembro de 2021, a partir da Deliberação Nº 430 / 2021 – SAOC, de 08 de novembro de 2021, a Coordenação da Comissão Permanente da Política Institucional pela Diversidade, Gênero, Etnia/Raça e Inclusão (CPID), que nasce de um histórico de lutas da comunidade acadêmica em prol de uma universidade mais justa e equânime, e que desenvolva ações de combate às inúmeras violências e desigualdades ainda presentes neste ambiente.
Um dos objetivos da CPID é promover ações de sensibilização sobre etnia/raça, gênero, sexualidades, diversidade, cidadania, inclusão, respeito, mediação de conflitos, situações de violência, preconceito e discriminação. Nesse sentido, para que ações permanentes sobre as temáticas sejam efetivadas na UFRRJ, em 2023, as ações de extensão da CPID foram organizadas em cinco grandes campanhas preventivas e educativas, no intuito de mobilizar toda a comunidade universitária, a saber: Mulheridades (Mês das Mulheres, março; e Agosto Lilás – luta contra a violência de gênero); Orgulhe-se! LGBTQIA + RURAL (junho); Setembro Amarelo – mês de prevenção contra o suicídio; e Por uma Rural Antirracista (novembro). Dessa forma, a CPID propõe e incentiva que atividades extensionistas, de ensino e de pesquisa aconteçam – seguindo o calendário das campanhas – ao longo do ano todo.
Em relação à questão específica do assédio, a CPID mobilizou e coordenou, até o momento, duas campanhas: Agosto Lilás, em 2022; e Mulheridades, em março deste ano. A campanha Mulheridades, que girou em torno das pautas das mulheres, atingiu mais de 2000 pessoas nas 31 atividades propostas. Neste momento, está sendo iniciado o planejamento das campanhas de Agosto (lilás) e Setembro (amarelo) cujo tema será Assédio Zero, uma vez que a UFRRJ aderiu à Campanha da Rede Brasileira de Mulheres Cientistas (RBMC) que já iniciou esse debate a partir do mês de junho.
Por fim, a Administração Central reitera a todos os membros da comunidade universitária, em especial aos dirigentes universitários, acerca da necessidade da participação e divulgação das campanhas institucionais de prevenção, além do acionamento dos instrumentos legais e institucionais disponíveis, mediante o encaminhamento às instâncias competentes para a apuração de todas as denúncias comprovadas de assédio moral e sexual, respeitando-se os princípios constitucionais do devido processo legal, do direito ao contraditório e da ampla defesa.
Para informações mais detalhadas sobre o assunto, recomenda-se a consulta dos documentos disponíveis nos links a seguir:
Conselho Nacional do Ministério Público.
Ministério Público do Trabalho.
Procuradoria Geral do Trabalho.
Administração Central da UFRRJ