Por Ricardo Portugal (Coordenadoria de Comunicação Social/UFRRJ)
A VII Semana Jurídica do Curso de Direito do Instituto Multidisciplinar da UFRRJ teve início no dia 27 de agosto e encerrou-se na sexta-feira, dia 31, com a presença do desembargador André Ricardo Cruz Fontes, presidente do Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região. A iniciativa teve como parceiros o Centro Acadêmico Paulo Cosme de Oliveira (Capac); a Procuradoria Geral do município de Nova Iguaçu, representada pelo Dr. Oscar Bittencourt, chefe do Centro de Estudos Jurídicos da procuradoria iguaçuana; o Laboratório de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Leafro) do IM/UFRRJ; e a Coordenação do Curso de Direito do IM/UFRRJ (organizadora da VII Semana Jurídica).
Estiveram presentes também na solenidade de encerramento da Semana Acadêmica o reitor da UFRRJ, Ricardo Berbara; a pró-reitora adjunta de Extensão, Gabriela Rizo; o diretor do IM/UFRRJ, Paulo Cosme de Oliveira; o diretor de câmpus do mesmo instituto, Geraldo Pinheiro; a coordenadora do curso de Direito do IM e fundadora do Laboratório de Direitos Humanos da Baixada Fluminense, professora Débora da Silva Roland; além dos estudantes dirigentes do Capac, Nathália Damasceno Victoriano, Pedro Henrique Fernandes e Mariana Lamassa. Prestigiaram também com suas presenças os alunos-atletas da Atlética da Rural, que presentearam o reitor da universidade e o desembargador André Fontes com uma camiseta da instituição. A Semana Jurídica do IM/UFRRJ tratou de diversos temas, além da promoção de Oficinas Jurídicas e da Primeira Mostra de Pesquisa do Curso de Direito do Instituto Multidisciplinar da Rural. Foram fornecidas também cinco horas-aula por dia de participação, para aqueles que compareceram às atividades complementares do evento.
A solenidade de encerramento aconteceu no Auditório Professor Bruno Rodrigues de Almeida, do IM/UFRRJ. Em sua fala inicial aos presentes, o diretor do instituto, professor Paulo Cosme de Oliveira, saudou a plateia presente, agradecendo o comparecimento do reitor, e do desembargador André Ricardo Cruz Fontes, presidente do TRF. Paulo Cosme declarou que se sentia honrado com as ilustres presenças das citadas autoridades no encerramento da VII Semana Jurídica do IM, fazendo questão de frisar o apoio e prestígio que o reitor tem dado às atividades e eventos realizados no IM.
Em seguida, o reitor saudou e agradeceu também a presença de todos e do Dr. André Fontes, ressaltando a excelência das atuais relações entre a universidade e o Poder Judiciário. O professor Berbara também lembrou que o atual presidente do TRF-2ª Região foi aluno da UFRRJ, no curso de Ciências Ambientais, enfatizando sua formação eclética e a importância cada vez maior da formação humanística, antes da formação técnica propriamente dita. Para exemplificar o que estava dizendo, Berbara citou para os presentes a experiência que teve, como engenheiro agrônomo, no norte de Minas Gerais e Sul da Bahia, na região próxima à nascente do rio São Francisco. Ele citou que ali havia uma comunidade tradicional quilombola, que por séculos trabalhava na agricultura local. Nas épocas de vazantes do rio, formavam-se ilhas no leito do São Francisco e ali os quilombolas plantavam seus produtos para o próprio consumo. Com o passar do tempo, a legislação ambiental brasileira passou a proibir o uso daquelas ilhas formadas nos períodos de vazante do rio. O reitor da UFRRJ contou que tal proibição transformou aquela região num verdadeiro barril de pólvora, que envolvia as comunidades tradicionais (os quilombolas), com seus saberes tradicionais em conflito com os órgãos ambientais governamentais. Berbara então lançou a pergunta: como proceder um juiz diante de tal situação conflitante, onde os dois lados tem suas razões específicas? Como sair desse conflito de paradigmas, onde por um lado temos a busca pela sobrevivência e do outro a intenção preservacionista do diploma legal? E o próprio reitor respondeu: apenas a formação humanística do julgador, com senso de justiça social, será capaz de ultrapassar o disposto nas letras frias da legislação formal. Ele destacou que é precisamente essa a maior característica que o desembargador André Fontes possui, onde realça sua sensibilidade, que o orienta em sua sólida formação técnica e intelectual no campo do saber jurídico, além de seu doutorado em Ciências Ambientais e em Filosofia. O reitor parabenizou aos organizadores da Semana Jurídica do IM pela feliz ideia do convite formulado ao Dr. André Fontes para ser palestrante durante o evento. O professor Berbara colocou a UFRRJ à disposição de eventos como esse, que valorizam a cultura e o conhecimento.
História social e jurídica — Em seu pronunciamento, o Desembargador e Presidente do TRF/2ª Região-RJ começou agradecendo ao reitor e aos organizadores da VII Semana Jurídica do IM a gentileza do convite a ele dirigido, para ministrar a palestra de encerramento do evento, estendendo o agradecimento ao diretor do IM/UFRRJ. Ele destacou que foi com muita satisfação que retornou ao câmpus da Universidade Rural, onde afirmou guardar boas e felizes lembranças da época em que foi estudante de Ciências Ambientais da instituição.
Ele declarou que tem como hábito a busca das razões históricas, como tentativa de entendimento dos fenômenos da atualidade. O Dr. André apontou que para isso basta fazermos uma pequena incursão na história social e jurídica do ser humano, para chegarmos à figura do juiz moderno. Ele explicou que nos livros e nas faculdades de Direito predominava a convicção que basta haver mais de uma pessoa na relação jurídica para que brote nesse contexto a ideia de “direito”. A rigor, segundo o magistrado, todos os povos submeteram-se a essas noções. Só que em determinados povos, associava-se essa ideia a uma outra figura muito mais antiga que o próprio Direito: a Religião. Isso aconteceu entre os egípcios, gregos, babilônicos e hebreus, os quais citou como exemplo. No entanto, o advento entre nós do nascimento do Direito foi bem posterior a esses povos mencionados, surgindo tal conceito com o aparecimento de Roma em 753 A.C.
E isso ocorreu, segundo o desembargador, em razão do politeísmo dos romanos que cultuavam mais de um deus, inspirados pela civilização helênica, da Grécia antiga. Uma particularidade interessante do povo romano destacada pelo palestrante foi a de que eles concentraram os seus deuses em uma única figura, e para cada um dos ramos conhecidos. Exemplo: para o Amor Sublime, os gregos tinham Afrodite e para o Amor Carnal, tinham Eros. Já os romanos tinham apenas Vênus, para ambos os tipos de amor. Já a “justiça” na Grécia era representada pelas figuras de duas deusas, uma mãe e sua filha. Em Roma, era apenas uma deusa, cujo nome era Justiça. Ele explicou que o nome “justiça” que usamos atualmente no latim vem do nome dessa deusa, chamada Justiça.
O fato é que esse período inicial do Império Romano vai nos trazer uma série de consequências práticas, em função da característica politeísta (vários deuses) do povo romano, redundando com isso no aparecimento do Direito. Em Roma, a Cidade-Estado cresceu muito e os romanos não eram um povo trabalhador e sim tinham a característica de guerreiros. Mas gostavam do bem-estar e do bem viver. Os romanos cresceram como cidade e se tornaram ricos e poderosos, pela facilidade de encontrar soluções práticas para seus problemas cotidianos. Um detalhe curioso é que quando Roma foi fundada não havia mulheres em quantidade suficiente para os homens, conforme aconteceu também por aqui, no Brasil. De certa feita, os romanos fizeram uma festa, embebedaram os sabinos (de uma cidade vizinha a Roma), raptaram suas mulheres e casaram-se com elas. Quando os sabinos se curaram da ressaca da bebida, resolveram vingar-se dos romanos, planejando uma guerra contra eles. As mulheres sabinas impediram que esse confronto ocorresse. Disseram a seus antigos maridos sabinos que caberia a elas a decisão sobre com qual povo iriam ficar. Depois de discutirem, escolheram ficar com os romanos, não restando ao povo sabino outra opção, qual seja a de se fundir com o povo romano, em razão da inexistência de mulheres na cidade, pois todas foram morar em Roma com seus novos maridos. Daí se explica o fato da figura feminina ter muita influência na Roma antiga, chegando ao ponto da maioria das divindades serem mulheres, associando a mulher a ideia de “justiça”. Muitos povos, além dos romanos, também adotavam essa compreensão, como a ideia de “dar a luz” quando geravam filhos. Tal gesto era entendido pelo diversos povos (não apenas os romanos) como uma atitude “iluminadora” que abençoava a todos com o nascimento das crianças.
Ainda hoje, segundo o Dr. André Fontes, há povos, como os muçulmanos e os judeus, onde a ideia de “direito” e “religião” são amalgamados. Entre os católicos, há também o Direito Canônico, o que não deixa de ser uma ramificação do Cristianismo, pois o mesmo não tinha uma doutrina jurídica que o sustentasse.
Mais tarde, é Portugal quem vai nos trazer a figura do magistrado, do juiz de Direito, que constitui-se numa derivação dos sacerdotes dos povos antigos (Grécia e Roma, principalmente). É esse juiz português, formado pela Universidade de Coimbra e que ia a cavalo ou de carruagem percorrer o interior do Brasil e que passou a ser reconhecido como “juiz de Direito”, diferentemente daqueles juízes de paz, que celebravam casamentos e batizados, apenas.
Uma grande parte desses juízes portugueses e que aqui se tornaram professores dos cursos de Direito em Recife e São Paulo, de acordo com o presidente do TRF, fugiram de Portugal em razão da briga entre os irmãos Miguel e Pedro I. A base desses primeiros contingentes de magistrados e professores de Direito em nosso país foi composta pelos formados pelos primeiros cursos jurídicos em Recife e São Paulo, pelos portugueses que se estabeleceram no Brasil e pelos juízes que fugiram de Portugal, em razão da briga entre os dois irmãos soberanos.
Por fim, o palestrante concluiu explicando o porquê dos julgamentos no Brasil serem feitos publicamente, e não a portas fechadas. Segundo ele, a prática é a da “legitimação dos julgamentos”, submetidos ao crivo da opinião pública brasileira. E isso se dá não pelo consenso em torno da Democracia, mas pelo fato do agente do Estado, ao julgar, estar submetido a uma estrutura formal que o povo brasileiro aceita e a sentença também estar condicionada a uma formalidade. E quanto à transparência nos julgamentos, a mesma está definida – na opinião do desembargador – como legitimadora das sentenças judiciais e não propriamente ao conceito que se tem de Democracia. Ele citou como exemplo a época da Ditadura Militar, onde não havia democracia mas os julgamentos eram feitos a portas abertas, à luz do dia, para que se fossem legitimados a partir do conhecimento público.