Depois de uma longa estadia na França, o professor Gabriel de Araújo Santos, do Instituto de Agronomia, voltou para a Rural cheio de ideias. Ali em 1998, ninguém imaginava que sua experiência no pós-doutorado em Educação Agrícola na Escola Nacional de Formação Agronômica de Toulouse inspiraria um projeto que mudaria o rumo de centenas de agrônomos no Brasil: o Programa de Residência em Engenharia Agronômica da UFRRJ, voltado para profissionais recém-formados. Com colaboração da FAPUR, o projeto funciona há 17 anos e já beneficiou cerca de mil engenheiros da área.
Nascida em 2000, a iniciativa oferece a oportunidade para os beneficiados atuarem em locais como empresas, cooperativas, usinas, prefeituras e outras instituições públicas e privadas do país inteiro, para ganharem experiência e se inserirem no mercado de trabalho. Eles se tornam alunos da Rural e são orientados por professores da instituição nesse processo. O período da residência pode durar de um a dois anos. Para participar, o interessado tem que estar graduado, mas precisa ter recebido o diploma há pouco tempo: exige-se que ele tenha até três anos de formatura. Hoje, o projeto tem 23 residentes atuando na Central Estadual de Abastecimento (CEASA), nas empresas Irmãos Benassi e DuPont, na Associação Pró-Gestão das Águas da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul (AGEVAP) e no próprio programa de aquisição de alimentos da Universidade Rural.
Apesar de a ideia ter sido inspirada pelo professor Gabriel Araújo, quem coordena o projeto desde o início é o professor Eduardo Lima. A ideia também foi abraçada pelo diretor do Instituto de Agronomia da época, o professor Clarindo Aldo Lopes.
Lima explica que, ao retornar da França, Araújo relatou ter conhecido um programa de residência no país e sugeriu que se fizesse algo semelhante na Rural.
“Na França, eles têm um sistema em que o aluno de Agronomia, no início do curso, passa seis meses junto com uma família de agricultores, trabalhando como se pertencesse à família. Depois, ele volta e faz o curso. Quando chega ao último período, ele retorna para o mesmo local em que fez o estágio no início, já com a preparação teórica que teve, para ajudar a mudar a realidade daquele produtor”, conta Lima. “A nossa realidade é diferente e, portanto, pensou-se em um programa semelhante, mas após a graduação do agrônomo. E a partir daí, criou-se o regulamento, fizemos contatos, e a primeira turma surgiu no ano 2000”, relata o professor.
Ao longo do tempo, os professores aprimoraram o projeto e, hoje, Lima conta que é um sucesso.
“O programa tem um índice de sucesso muito grande. A ideia principal é o estudante ter uma experiência profissional: ele acabou de graduar, muitas vezes não tem experiência nenhuma . O programa de residência dá essa oportunidade de ele adquiri-la, com um orientador da Rural e um orientador no local de trabalho. Então, normalmente, o que acontece? Ou o aluno é contratado onde fez a residência, ou ele começa a ter contato com o mercado e acaba ficando em alguma empresa que viu o seu trabalho, ou até faz uma pós- graduação, por causa da experiência que teve. Em alguns outros casos, durante o próprio programa, o trabalho do residente se destaca e chama a atenção de uma instituição ou empresa que o convida a integrar seu quadro de profissionais. Nosso índice de sucesso nesse escopo está em torno de 70%”, destaca Lima.
Os professores selecionam os residentes através de um edital público, aberto a agrônomos recém-formados em qualquer universidade do Brasil. O estudante é matriculado na Rural, mas, dependendo de onde for o local onde fará residência, o projeto entra em contato com docentes de universidades mais próximas para orientá-lo.
As expectativas para o projeto nos próximos anos, segundo Lima, é de consolidar novas parcerias, para dar conta dos custos do programa.
“As perspectivas para o futuro estão focadas na busca de novas parcerias que permitam uma maior abrangência nos campos de atuação que fazem parte da competência do engenheiro agrônomo e também possam viabilizar o aumento na oferta de vagas”, considera o professor. “Os parcos recursos institucionais não têm condição de cobrir os custos com a manutenção do programa, sobretudo com as bolsas para os profissionais residentes”, complementa.
A atividade que o aluno vai exercer no local de residência depende da demanda de cada caso. Na CEASA, por exemplo, alguns residentes trabalham captando alimentos que ainda estão bons para consumo, mas que os supermercados rejeitam por não estarem adequados ao “tempo de prateleira”. Esses alimentos passam por uma filtragem e são distribuídos para instituições de caridade.
Enquanto isso, na multinacional DuPont, do setor agroquímico, os residentes realizam pesquisas em genética e biologia molecular. A companhia americana tem uma filial em Paulínia (SP), onde se desenvolve produtos para controle de insetos e doenças.
Já na empresa Irmãos Benassi, presente no Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Minas Gerais, os residentes desenvolvem o controle de qualidade dos produtos. A companhia é atacadista de hortifrutigranjeiros, e nela os estudantes realizam a inspeção dos alimentos disponibilizados para venda e fiscalizam o armazenamento e a distribuição. Essa é a função, por exemplo, da residente Amanda Silva Nunes, de 28 anos. Formada na Rural em dezembro de 2014, a carioca entrou na empresa um ano depois e está lá até hoje. Ela inspeciona a qualidade de frutas e hortaliças pós colheita, além de verificar sua adequação para a estocagem, antes de liberar para os mercados.
“Diante de uma mercadoria irregular ou que apresente problemas fitopatológicos, emitimos um laudo técnico informando ao fornecedor ou produtor daquela mercadoria que ela se encontra fora do padrão de comercialização da empresa, sendo efetuada a devolução da mesma em alguns casos”, conta Amanda.
A jovem afirma que, depois de entrar no projeto, ela pôde conhecer melhor alguns temas aos quais não teve acesso durante a graduação.
“Tenho a oportunidade de colocar em prática todo conhecimento adquirido teoricamente durante as aulas e também posso aprender sobre frutas que não foram lecionadas, como maçã, pera e outras frutas de caroço”, relata. “Acredito que, para a Universidade, projetos como esse contribuem para que a instituição tenha visibilidade diante de outras, pois, dessa maneira, ajudam seus alunos na busca de aprendizado prático, incentivando, desta forma, que novos alunos ingressem na faculdade”, finaliza.
Luana Lima da Silva é um dos casos de êxito do projeto. Ex-aluna da Rural, ela entrou no processo de residência em setembro de 2010 e, em 2012, foi efetivada na empresa Irmãos Benassi. Hoje, a agrônoma de 33 anos é gerente de qualidade da companhia.
“Esse projeto é fundamental para que empresas como a irmãos Benassi tenham a oportunidade de trabalhar com profissionais atualizados, dispostos a aprender e colocar em prática seus conhecimentos, a um baixo custo, contribuindo para o desenvolvimento da empresa”, opina ela. “Além disso, possibilita que esses jovens profissionais se insiram no mercado de trabalho”, complementa.
Por Victor Ohana, da FAPUR.